sexta-feira, 13 de abril de 2018

UM GRANDE REENCONTRO COM O PROFESSOR ARRUDA


Quem não planta jardins por dentro, não planta jardins por fora e nem passeia por eles. (Rubem Alves)

Outro dia uma amiga me mandou uma mensagem com um conteúdo que me encheu de alegria e trouxe boas lembranças do tempo de escola. A mensagem, escrita em uma folha de papel almaço com letras firmes e belas (pela beleza da letra a caneta usada só podia ser a Bic azul),trazia a notícia da possibilidade dos ex-alunos do Professor Arruda o reencontrarem. De imediato surgiu na memória a imagem do Professor Arruda tocando violão, cabelo comprido e cheio de vida. É assim que me lembro dele! Em silêncio diante da boa notícia, ouço ainda depois de tanto tempo, sua voz cantando em inglês, francês e música popular brasileira. Um tempo em que a repressão amedrontava o Professor Arruda, mas aproximava aluno e mestre. Com arte.

Assim foi o Professor Arruda. Assim continua sendo o Professor Arruda...

Depois de quase duas décadas de distância, a notícia de reencontrá-lo pegou fogo nas redes sociais. Alguns ex-alunos falam com emoção do Professor Arruda,como se ele estivesse presente fortemente em suas vidas até o dia de hoje.Presente neste instante! Talvez esteja nessas emoções transformadas em sentimentos o papel de um professor, aquele de marcar para sempre seus ex-alunos.  Os conselhos estão ali guardados como se estivessem sendo ditos todos os dias. Os ensinamentos do Professor Arruda estão ali, são despertados quando precisamos. Afeto.  É isso que ele deixou em seus alunos.

Emociono-me quando alguns ex-alunos se remetem ao passado e começam a lembrar dos amigos de escola e a contar histórias hilárias. O Professor Arruda é o ponto de partida dessas lembranças. Um sabor de tempo bom. Como deve ter valido a pena, Professor!É bom sempre lembrar:O mestre Arruda começou sua vida de Professor nessa época. Uma época em que se buscava reencontrar a liberdade.Ainda muito moço vindo de Pereiras, no interior, em busca de trabalho,encantou com seu jeito simples.

Assim é o Professor Arruda. Não teve medo de se misturar aos seus alunos e mostrar que todos nós também podíamos encontrar um lugar ao sol. “Caminhando e cantando,e seguindo a canção. Somos todos iguais,braços dados ou não. Nas escolas, nas ruas, campos, construções. Caminhando e cantando, e seguindo a canção.” Arruda, você pode caminhar pelo jardim que você plantou dentro de cada um de nós. Ao som do seu violão e de sua voz. Ninguém e nem o tempo pode tirar estes sentimentos de nós. Gratidão!


Estou ansioso para o encontro. Quero dar um forte abraço no Professor Arruda e agradecer por nos mostrar o mundo com maestria. Não é à-toa que cada professor passou pelas nossas vidas e nos marcou profundamente. Tudo tem um sentido. Trouxe-nos uma parte do conhecimento universal produzido pela humanidade. Ensinou-nos a nos posicionarmos diante da vida com sabedoria. Ensinou os caminhos da ética diante dos percalços da vida. Obrigado a todos os “Professores Arruda” deste mundo de meu Deus. A vida é apenas um instante, e é tão bom perceber e reconhecer quando alguém passa por nós e deixa tanta coisa boa. 

terça-feira, 10 de abril de 2018

NASCIDO SOB O SIGNO DE TOURO


Quando nasci, um anjo torto me disse: vai ser gente na vida, menino!Obedeci. (Parafraseando Carlos Drummond de Andrade). Nasci no ano de 1960,no dia 15 do mês de maio. Tempos de contracultura, festivais, Jovem Guarda, Tropicália e outros movimentos que transformaram o mundo nas décadas seguintes. O mundo foi virado de ponta cabeça. Quando comecei andar os primeiros passos e a me equilibrar sobre as pernas, era colocado em cima de uma mesa e,com a família em volta, dançava ao ritmo de um rock androll. Nasci na cidade de Votuporanga, interior de São Paulo, na casa da parteira Dona Catarina, de parto normal, e aos gritos anunciei minha chegada. Dias depois fui registrado perante a lei na cidade de Fernandópolis, com o nome de Marcos Roberto Bueno Martinez. Assim cheguei neste mundo de meu Deus.

Nasci filho de José Molero Martinez e Aparecida Bueno Martinez. Meu pai da cidade de Tanabi e minha mãe da cidade de Olímpia. Meu pai era sitiante, e desde muito jovem comercializava gado e outras produções do sítio da família. Foi construtor de casas, marceneiro e vendedor de alumínio nas Minas Gerais, de onde trazia queijos para vender em Votuporanga. Gostava de cantar música caipira de Tonico e Tinoco, de Tião Carreiro e Pardinho, e outras do estilo. Foi pasteleiro, profissão que exerceu até o fim da vida. Um homem cheio de alegria e de boa índole. Minha mãe, filha de gente simples, desde cedo ajudava o pai nos afazeres do sítio e a cuidar dos irmãos menores. Mulher forjada no trabalho, que correu atrás dos seus sonhos. Ser professora era seu desejo.Estudou e fez magistério, e a maior parte da sua vida lecionou e transmitiu seus conhecimentos para as crianças. Mulher de fibra. Foi neste ambiente que cresci e posso dizer que vivi com alegria.

Entrei na Escola Primária Santa Luzia, em Votuporanga, em 1966, para inserir-me no mundo do conhecimento. Com nove anos comecei a trabalhar como auxiliar de sapateiro e como apanhador de algodão e maracujá na temporada de colheita. Este trabalho eu fazia escondido do meu pai e da minha mãe, pois o desejo deles era que eu apenas estudasse. Com onze anos trabalhei na plantação de café. Com doze fui responsável por  mais de trinta adultos neste trabalho.Com 13 anos fui trabalhar de empacotador no Supermercado Amazonas, na minha cidade.Porém, mesmo começando a trabalhar cedo não deixei de ser criança. Gostava de nadar nas lagoas e córregos de Votuporanga. Quase todo final de tarde e já no início da noite a rua ficava lotada de crianças e caíamos nas brincadeiras. Salva-pega, esconde-esconde, apostávamos corrida, jogávamos bola e outras brincadeiras de que não lembro o nome. O que eu mais gostava era quando algum circo chegava à cidade. Circo do Pimentão, do Faísca. Gostava tanto, que uma vez participei,escondido do meu pai,de uma peça de teatro com o nome de “O Lavrador”.Assim é que fui sendo criado. Assim é que fui sendo educado. Assim é que fui sendo moldado.

Nas décadas de 60 e 70 o Brasil começou a deixar de ser rural, e aos poucos a indústria dominou a economia. Surgiram os grandes centros comercias e industriais.Muita gente do campo e das pequenas cidades do interior do país veio buscar uma vida melhor e também uma melhor condição financeira. Foi nesta busca que cheguei a São Paulo em 1975, há 42 anos. Cheguei a Cotia em 1978, minha cidade do coração e onde moro até hoje. Trabalhei como empacotador na loja Eletroradiobraz, na Rua Butantã em Pinheiros. Depois trabalhei na loja Pelicano do Largo de Pinheiros. Depois de oito anos distante da escola, voltei a estudar. Depois de terminar os antigos cursos Ginasial e Colegial(atuais Ensino Fundamental e Médio), fiz faculdade e me licenciei na disciplina de História. Durante vinte e dois anos lecionei em escolas públicas. Trabalhei na antiga Tintas Wanda, na Nogam. Neste período me envolvi “de cabeça” em movimentos sociais para o retorno da democracia. Cresci assim, vivendo a vida intensamente, e foi muito bom fazer essa caminhada. Percebi o quanto as coisas vão ficando distantes e a gente não se apercebe. Como se a memória fosse apagando um pouco dessa vida vivida.

Durante oito anos fui Secretário de Educação de Cotia, no período de 2001 a 2008. Fui o primeiro Secretário de Educação a ser eleito pelos meus pares. Aquilo que assumimos como compromisso no projeto educacional se realizou em tudo e em um pouco mais. Construímos trinta e duas escolas, entre elas dezessete creches. Cuidamos da situação funcional dos professores. Materiais escolares foram distribuídos duas vezes ao ano para todos os alunos. Implantamos o transporte gratuito escolar (TEG) no município, para facilitar a vida dos alunos que tinham dificuldade de chegar à unidade escolar. Oferecemos merenda escolar de qualidade. Distribuímos uniformes para todos os alunos duas vezes ao ano (verão-inverno).  Com o passar do tempo, o resultado que alcançamos, segundo o Índice Paulista de Responsabilidade Social,foi o 48º lugar, no ano de 2006. (Antes, no ano de 2000, a cidade de Cotia aparecia na 454ª colocação – péssima).

Atualmente trabalho em um instituto de pesquisas educacionais, o IAESP. Neste breve pedaço da minha História conquistei amigos. Infelizmente consegui alguns inimigos. Mas também conquistei parceiros, pois nada se faz sozinho. Desta maneira, as nossas conquistas foram obtidas com muito esforço coletivo. Espero que nesta passagem por aqui minha vida seja útil para alguém. Não me arrependi de nada do que fiz. Aprendi muito com gente especial que atravessou minha trajetória. Aprendi muito com os inimigos. Assim sendo, encerro este meu currículo e sinto-me apresentado.

Professor Marcos Roberto Bueno Martinez