terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Bandas Jazz XV de Agosto e Ritmo Continental


Encontros das bandas no Clube Recreativo, que pertencia à Cooperativa Agrícola de Cotia. O salão ficava próximo à Rua Joaquim Horácio Pedroso, ao lado do posto de saúde central. As bandas Jazz XV de Agosto e Ritmo Continental embalaram as festas da cidade por muitos anos. Conta Antônio Lopes Navarro, o “Abobrinha”, que logo que chegou à cidade, nos anos 50, passou a fazer parte da Banda XV e teve que aprender a música Pau D’água, que fazia sucesso entre os freqüentadores do Clube Recreativo.

Formação da banda Jazz XV de Agosto: Zucão (cantor), Canuto Passos (trombone de vara), Valdemar Gonçalves, o Praia (bateria), Osvaldo Passos (sax e clarinete), Laudelino Passos (sax), Butina (bateria), Ovídio Passos (bôngo), Cuitelo (pistão), Antônio Lopes Navarro, o Abobrinha, (cantor). Era uma cidade musical.

A Banda Jazz XV de Agosto, sempre fazia suas apresentações no Esporte Clube Portão. O cantor era o Abobrinha, Laudelino e Osvaldo Passos no sax. Nessa época o clube localizava-se à Rua Macapá.

Outro local que a Banda Jazz XV de Agosto fazia suas apresentações no Clube das Graças, no Morro Grande. Na guitarra, o “Zé Lenha”. Era raro “o sábado que não tinha um bailinho”, diz Abobrinha. Os ritmos mais solicitados pelos dançarinos eram o bolero, a música romântica, o samba e o samba-canção.

Outra banda de sucesso era a Ritmo Continental. Apresentavam se no Clube Santa Cruz. Formação: Toninho Medeiros (sax) e Flávio (bateria); em pé, de esquerda para direita – Abobrinha (cantor), Vespa (contra-baixo), Ewaldo Fecchio (sax), Marcos Savioli (clarineta), Ditide (trombone de vara). Além dessas bandas, existia outra chamada Vosso Jazz, que era composta pelos músicos mais antigos e experimentados da cidade.


TERAPIA URBANA


Um senhor distinto sentado no último vagão do trem que faz a linha Santana a Jabaquara do Metro. Óculos escuros e terno bem engomado. Braços firmes de gente bem criada. Uma postura impecável. Diante do banco em que o senhor se sentou, um pôster de uma linda mulher com os dizeres: “Não esqueça objetos no vagão.” e “Mantenha o vagão limpo.” Uma companhia agradável aos olhos do senhor.

 Do lado dele se senta uma senhora de meia idade, que desanda a falar sobre o filho, sem saber se o senhor estava disposto a ouvir. “Criei com tanto carinho! Trabalhava dia e noite para dar o de melhor pra este menino. Criei sozinha, sem pai. Nasceu de uma aventura. De um tempo pra cá, meu senhor, deu para responder e dizer que quer conhecer o pai de qualquer jeito. Não sei por onde anda o pai. Foi só aquela noite, nem o nome sei se é verdadeiro. Agora ele deu para me xingar de nomes e me magoa profundamente. Uma vizinha fofoqueira diz que meu filho está andado com gente estranha. Gente que usa droga. Não acredito, ela fala da vida de todo mundo! Outro dia ele me disse que o pai deve ser muito legal, pois este não lhe enche o saco.” Quando ela ia perguntar o que o senhor achava de tudo aquilo, chegou a estação da Praça da Sé, seu lugar de descida. Não ouviu e nem sentiu qualquer gesto do homem, que continuava ali estático, como uma barra de gelo.  Ainda antes de descer murmurou entre dentes “que homem mal educado”.

Ali na Estação da Sé, sobe ao trem e se senta ao lado do senhor um jovem com seus vinte e poucos anos e com uma educação rara nos dias de hoje: diz “bom dia”. O homem não soltou uma palavra, nada, a não ser um gesto com a cabeça quando a porta do vagão fechou e com a saída do trem deu aquele leve tranco. O garoto viu naquele gesto com a cabeça a possibilidade de uma conversa. Ele comentou sobre o calor que estava fazendo e desandou a falar sobre a traição que sofrera, sem se importar se tinha alguém ouvindo em volta. Queria de qualquer jeito se livrar daquela dor no peito que o atormentava. “Fui traído pelo meu melhor amigo. Ela era a mulher da minha vida. Fiz de tudo. Abri mão de sonhos para ficar do lado dela. Depois de um dia de trabalho peguei os dois na nossa cama. Não consegui reagir. Fiquei inerte diante daquela cena. Na minha frente ela arrumou a roupa na mala e foi embora com o traidor. Ele, com cara de assustado. A angústia tomou conta de mim. Há quanto tempo ela me traía?” O senhor continuou em silêncio. O garoto via aquele silêncio como um gesto de solidariedade do desconhecido que estava ao lado. Próximo da estação da Aclimação, onde desceria, o jovem agradeceu pela atenção dada. Disse o rapaz: “O seu silêncio me falou muito, senhor.”.

Na estação Aclimação entra no vagão um senhor por volta dos seus quarenta anos. Aquele tipo de sabe tudo e que não aceita a idade que tem. Gente que sempre acaba sendo ridícula. Senta bem do lado do senhor distinto, que continua ali parado como um soldado em sentido de continência diante do seu superior. Teso. O quarentão se sentou grosseiramente, impedindo que uma senhora de idade avançada se sentasse. Jogou-se na frente da senhora e sentou sem nenhuma cerimônia. Começou a falar tão alto, que além das pessoas que estavam próximas, até o último passageiro sentado do lado oposto também ouvia suas bravatas. Dava tapinhas no ombro do senhor distinto com a maior intimidade e dizia que só paquerava moças novas. Ao final de cada conversa mole lá vinha um novo tapinha no ombro do senhor, que mesmo diante de tanto estardalhaço continuava em silêncio. Tudo o que o fanfarrão falava era para mostrar que ele era o melhor do mundo.

O trem chegou ao final da linha, no Jabaquara. As pessoas descem com pressa e o grosseiro se levanta bruscamente e com indiferença desce, como se não tivesse ninguém ao seu lado. O senhor fica ali estático, não move nenhum músculo do corpo. Quem seria aquele senhor que passou a viagem toda só ouvindo lamentos? Qual seria seu destino? Talvez ele pudesse ser um funcionário desses que fiscalizam a qualidade do serviço oferecido. Ou então, seria um dedo duro a serviço de algum patrão. Será que ele estava ali há muito tempo? Quantas pessoas não passaram naquele dia pelo seu divã?

Durante todo o percurso da viagem da linha azul do Metro, uma senhora de cabelos grisalhos, bem vestida e discretíssima, observava aquele senhor que permanecera imóvel quase toda viagem. Não movera um músculo do corpo. A cor pálida lhe chamara ainda mais a atenção. Com o vagão quase vazio, a não ser os dois ali, a senhora, médica de profissão, examina o pulso e percebe que o senhor está morto. Sem escândalo nenhum chama os seguranças do Metro, e com educação peculiar se identifica e avisa sobre o falecimento daquele passageiro misterioso. Apenas faz um pequeno comentário, que pela rigidez do corpo aquela não tinha sido a única viagem. O homem não pode ser identificado, pois não tinha um documento sequer. Na pasta de couro fino que estava do lado do corpo uma foto, e nela uma senhora e dois jovens. Talvez a esposa e os filhos. Não demorou muito para que a notícia do homem morto no Metro se espalhasse como vento. Os curiosos se aglomeravam e os jornalistas chegavam, ávidos por um furo de reportagem. A médica, depois do serviço prestado, sai discretamente.
 
Eu imagino que, depois de chegar à casa cansada de um dia de trabalho pesado, a primeira senhora que se sentou ao lado do senhor elegante tira os sapatos, senta no sofá quase se deitando, liga a televisão e vê a noticia de que fora encontrado um senhor morto no Metro que fez toda viagem na linha Santana ao Jabaquara. Fica atônita. A senhora tem um sobressalto e pensa, “Nossa, Virgem Maria, eu sentei do lado dele e achei que ele foi mal educado!”. O repórter anuncia em tom dramático que ele sofrera um infarto fulminante. Que sua família ainda não tinha sido encontrada. A única forma de identificá-lo era através de uma fotografia encontrada ao lado do corpo. A senhora fica desolada. O repórter sensacionalista cria incansavelmente um dramalhão mexicano. O homem foi encontrado sem documentos. Mostra a foto à câmera, na esperança de que talvez alguém da família possa estar assistindo o programa...

Isso imagino eu! E os outros dois que sentaram ao lado do defunto, como ficariam quando ficassem sabendo da morte do seu acompanhante silencioso? Será que mais alguém teria sentado ao lado do senhor e não percebido que era um cadáver? A indiferença é algo que dói profundamente. Chega a chocar... 

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Os Cavaleiros da Esperança


Ao conversarmos com Benedito Viviane sobre a idéia de construir um hospital em Cotia, em meados da década de 60, a emoção determina a tônica da entrevista. O Sr. Viviane lembra a dificuldade que os interessados enfrentaram e o medo de fracassar nesse projeto, medo que iria persegui-los durante todo o processo de construção do prédio.

Recorda que, antes da idealização da construção do hospital, um grupo de moradores da cidade já havia tido essa mesma idéia, na década de 50, tendo recebido verbas do Estado e a doação de um terreno, onde hoje está a Rodoviária de Cotia. Na época, o sonho da cidade fracassou, e os moradores tiveram que devolver as verbas ao Estado e o terreno, ao seu proprietário original. Porém, a necessidade de um hospital e a coragem de um novo grupo romperam com qualquer impedimento que inviabilizasse o sonho de sua construção – diz o Sr. Viviane –, inclusive, o medo do fracasso.

No barzinho da D. Amélia e do Sr. Godói, o Jacaré, num domingo de sol, surgiu a idéia de construir uma Santa Casa em Cotia – foi da conversa entre o Dr. Osvaldo Manuel de Oliveira e o Dr. Rubens Ferrari. Recorda o Sr. Viviane que os partos eram muitas vezes realizados por parteiras e em outras vezes em hospitais distantes daqui, um em Osasco e outro nas Clínicas, em São Paulo... muitos partos foram realizados na estrada.

Uma semana depois da decisão de construir uma santa casa em Cotia, foi marcada uma reunião, que se realizou no Cinema do Jubran com a presença de 400 pessoas. Haruyuki Yano, chamado o “Patriarca do Hospital” pelo Sr. Viviane, aderiu à idéia que surgiu no bar e ambos ajudaram a organizar a reunião. Os organizadores levaram a proposta de formação de diretoria da Associação da Santa Casa de Cotia. Indicações dos nomes: presidente – Sr. João Tavares, diretor da casa de detenção de São Paulo; vice-presidente – Dr. Rubens Ferrari, juiz do Trabalho de São Paulo. Os outros nomes dos componentes que formavam chapa: Dr. Osvaldo Manuel de Oliveira, Harayuki Yano, Pedro Victor, Dr. Edson Frederich, Sr. João Torrezani, Sr. Benedito Viviani, Dr. Valdemar Albano, Sr. Nivaldo Abud, Sr. Ermínio “Despachante” e Sr. Epitácio Gadelha. Várias outras pessoas fizeram parte das reuniões do hospital de Cotia, porém não foi possível fazer um levantamento correto de todos os nomes. A reunião seguinte, realizada uma semana após a primeira, foi um balde de água fria: compareceram apenas trinta pessoas. Apesar do temor do fracasso o grupo não desistiu e continuou a realizar reuniões, todos os domingos, no salão no fundo da igreja, com uma média de 12 pessoas. Também se encontravam no Bar do Matias e no escritório do Sr. Yano.
Depois de dois meses de muita luta, entra em cena uma nova situação que vai provocar uma cisão no grupo: através de uma deliberação, o Sr. Yano convida para participar da reunião o Sr. Odair Pacheco Pedroso, conhecido em todo o Brasil por implantar hospitais. O Sr. Odair exigiu algumas condições para assumir a liderança construção. A primeira é que deveria ser um hospital e não uma santa casa. Outra exigência era que, para iniciar a construção, tinha escolhido uma equipe de quatro pessoas: Benedito Viviani, Yano, Osvaldo e Rubens Ferrari. Em relação aos nomes houve consenso, mas o conflito surgiu por causa de um hospital. Algumas pessoas preferiam que fosse uma santa casa. Esse fato não impediu que a Associação do Hospital de Cotia iniciasse suas obras.

Durante toda a fala do Sr. Viviani vê-se que os envolvidos no sonho de Cotia ter seu hospital estavam além das vaidades. Todos os moradores de Cotia conversavam sobre o hospital nas 24 horas do dia, e um fator de grande importância nessa empreitada é que todos os segmentos da sociedade cotiana se envolveram com a tarefa de construir o prédio.

“Ninguém está vendo nosso trabalho, mas lá de cima estão”
(frase escrita atrás da foto abaixo, enviada ao Dr. Odair em 1975)

Uma outra exigência do Dr. Odair Pacheco Pedroso para assumir a responsabilidade de construir o hospital de Cotia era ter carta branca para tomar qualquer tipo de decisão. O grupo envolvido cedeu a carta sem maiores problemas. Além de escolher os quatro assessores para a construção, o Dr. Odair formou também sua equipe clínica, com a participação dos médicos Dr. Eurico Toledo Carvalho, Dra. Lurdes, Dr. Antônio Monteiro, Dr. Antero Barrado, Dr. Alberto Caputo e Dr. Epitácio Gadelha.

Após a definição da equipe e a formação da associação, o lugar para construir o prédio. Para que se tenha uma idéia de como os moradores de Cotia se envolveram na construção do hospital, logo no início, houve três doações de terrenos. A dona Nhá Nhá se propôs a doar uma parte de suas terras, próximas ao Mirante de Mata. O Dr. Celso também se propôs a doar terras para a construção do hospital, onde hoje fica o Jardim Lina. A terceira opção de doação de terreno ficava nas proximidades do Arakan. Para visitar esses terrenos formaram-se três equipes de voluntários e, apesar da boa intenção dos doadores, os terrenos não agradaram muito às equipes. Como diz o Sr. Viviani, “Parece que não era para ser naqueles lugares. Estava faltando alguma coisa”.

Conta o Sr. Viviane que ele e o Sr. Yano foram conhecer o terreno do Arakan e alguma coisa lhes dizia que não era ali. De repente, olharam para o horizonte, com o “sopro do vento dos deuses”, disseram: “É naquele morro que vamos construir o hospital”. Para ter uma visão do local imagine-se no Bairro do Turiguara, olhando em direção ao hospital. Foi isso que eles viram, com a diferença de que em 68 toda essa região era coberta de mata. Após o presságio e com os pés no chão, Yano e Viviani procuraram o dono do terreno. O primeiro contato foi com o ex-prefeito Kenji Kira, com quem o Sr. Yano mantinha uma estreita amizade, e que, por coincidência, tinha a procuração do terreno que desejavam. O dono daquele terreno era Kenzo Cayano, que cedeu uma parte das terras – 10.000 metros quadrados – para a construção do hospital. É importante frisar que a doação do terreno foi possível com a incansável intermediação de Kenji Kira.

A cada etapa vencida, novos obstáculos. Sem ajuda governamental, a equipe e vários segmentos da sociedade local organizaram eventos para construção do prédio. O Sr. Viviani, que assumiu o papel de historiador, confirma nas suas anotações que nos trinta anos de existência do hospital foram realizados 130 eventos. O Sr. Jubran, que era dono do Cinema, ajudava cedendo sessões de filme. O dinheiro arrecadado ia para a construção do hospital. Um detalhe em relação aos eventos é que os responsáveis pela bilheteria eram sempre Viviani, Osvaldo e Yano. De todos os eventos, o que mais marcou foi o decreto do monopólio da vela, que durou de oito a dez anos. Tal decreto consistia no seguinte: no Dia de Finados, só podiam vender velas as pessoas ligadas ao hospital. Outras formas de arrecadar dinheiro eram os bingos, churrascos, muitos memoráveis, e os circos que ao chegarem a cidade ofereciam um dia de bilheteria ao hospital. É difícil acreditar, mas o hospital de Cotia foi construído dessa forma.

A fundação de associação se deu no dia 28 de janeiro de 1968, num domingo, às 11 horas da manhã, no sítio do Sr. Odair, em Ituverava. Sete anos depois, em 1975, o hospital foi inaugurado.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

A História da Lâmpada Queimada e Outras


Benedito Viviane, quando começa a lembrar da brincadeira da “história da lâmpada queimada” e outras traquinagens, estampa no rosto um sorriso de menino maroto. O Deposito de Material de Construções Bandeirantes era o lugar de encontro da turma, que inventava as diversas brincadeiras que embalavam uma geração, na década de 60 em Cotia.
No ano do 1964 espalharam em Cotia e na região milhares de folhetos anunciando a invenção do conserto de lâmpadas queimadas. Aruyuky Yano, Manuel Osvaldo de Oliveira e o Sr. Calil, foram os idealizadores dessa armação. A vítima escolhida pelo grupo foi o Sr. Viviani. Se não bastassem quase três mil folhetos distribuídos, a equipe colocou em pontos estratégicos da cidade faixas com o endereço de Benedito Viviane e ainda o valor do conserto do cada lâmpada. O preço foi determinado da seguinte forma: lâmpada comum, 5 mil réis, a de farolete, 10 mil.
Depois do marketing realizado, Viviane começou a receber centenas de lâmpadas queimadas em sua casa. Muitas vezes, Viviane mandava a pessoa levar as lâmpadas no deposito do Sr. Yano e dizia que a máquina de conserto estava na loja. A fama de “gênio da lâmpada”, apelido atribuído ao Sr. Viviani, em virtude da brincadeira, foi além das fronteiras do município. Quando chegava ao banco em Pinheiros, para cuidar dos seus negócios, o gerente perguntava como estava sua fábrica de conserto de lâmpadas. Respondia Viviane com o bom humor de sempre: “Vai muito bem!”. Numa festa realizada em prol do hospital de Cotia, na casa do Dr. Odair Pacheco Pedroso, com mais de 150 pessoas presentes, de repente acabou a energia elétrica. De surpresa o Dr. Odair gritou na multidão “Chame o Viviane!”. Um anúncio foi parar no quartel do Quitaúna. Quando o sargento ficou sabendo que um irmão do “gênio da lâmpada” era seu cadete, passou a tratá-lo com privilégio.
Durante dez anos o Sr. Viviani foi perseguido com a história da lâmpada. Um morador da Granja Viana deu graças a Deus quando ficou sabendo da oficina de conserto de lâmpadas. Esse morador guardou durante dez anos uma lâmpada de estimação para quando aparecesse o invento que a pudesse consertar. Na porta da casa da família Viviani, num final de tarde, apareceu um senhor acompanhado de seu filho com uma sacola cheia de lâmpadas. O menino, juntamente com o pai, estava subindo a escada, e, num singelo descuido, quebrou uma lâmpada. O pai, irritado, deu umas palmadas no garoto. Dizem que o senhor morava no bairro do São Joaquim. Para que se tenha uma idéia da dimensão da brincadeira o Sr. Viviani foi procurado por um jornalista da revista O Cruzeiro, que gostaria de entrevistá-lo.
Parece que nesse período o feitiço, de vez em quando virava contra o feiticeiro. Outra história pitoresca dessa época foi a prisão do Sr. Yano em Águas de São Pedro. A turma que gostava de brincar foi fazer uma viagem a essa cidade, onde tinham um amigo que era delegado. Conta o Viviane que o Osvaldo, o Calil e o delegado, arquitetaram o plano que levou à prisão do Yano. Mandaram prender o Sr. Yano onde estava hospedado com a turma. O policial chegou com a intimação e o levou para prestar depoimento. A única saída encontrada na hora foi não resistir à prisão e acompanhar o policial até à cadeia. O Sr. Yano falou entre lábios para o Viviani escutar: “Quem não deve não teme”. Yano, que sempre andava com uma carta de salvo conduto, naquela viagem esquecera o documento. A tranqüilidade inicial da fisionomia do Yano, com o passar do tempo, foi dando lugar a preocupação. Para tornar o fato mais real ainda, os amigos da onça, que se mostravam solidários nesse momento desagradável, solícitos e determinados, queriam viajar até Cotia para buscar a tal carta. Depois do depoimento e lavrado o boletim de ocorrência, Yano lamentava que “isto não poderia acontecer comigo, de forma alguma”. Os amigos se despediram, como se ele fosse ficar preso na cadeia de Águas de São Paulo, com a maior cara de pau. Após algumas horas do sofrimento, os colegas desvendaram a trama e Yano que respirou aliviado. Mas, logo em seguida, o Sr. Yano já estava preparando o troco.
Outra brincadeira, primorosa, foi o fechamento da porta principal da casa do Borbinha. Novamente o grupo aprontava alguma meninice. Num sábado à noite, depois que Borbinha foi dormir, o Sr. Zeca, a mando do grupo, fechou a porta da frente da casa dele com tijolos e cimento ´seca rápido´. No dia seguinte, ao abrir a porta, Borbinha deu de cara com a parede. Ele tentou pular a janela, mas não conseguiu porque estava muito gordo e logo ficou cansado. Depois de muitas tentativas começou a gritar e pedir socorro. Após um tempo apareceram algumas pessoas que o ajudaram a sair de casa. A porta foi removida só dois dias depois. Passado algum tempo, o Sr. Borbinha descobriu os malfeitores e encarou a brincadeira com muito humor.
A malhação do Judas era outra festa magnífica. Segundo o Sr. Viviani, aconteceram dois episódios nessa festa que foram marcantes. O primeiro foi realizado entre os anos de 1945 e 1960. O segundo de 1960 a 1969. O primeiro era organizado pelo Sr. Leiriano, Sílvio Pedroso e outros festeiros. Após a malhação e a missa do Sábado de Aleluia era organizado o testamento de Judas, com o objetivo de dividir os seus pertences. Sílvio Pedroso, leiloeiro do evento, distribuía cueca, calça, sapatos e objetos para algumas pessoas que depois se tornavam alvo de gozação. No início da década de 60, a turma da brincadeira retomou-a com a intenção de resgatar a malhação do Judas.
Atenção: o Sr.Viviane, que durante tanto tempo foi o mestre do conserto de lâmpadas, quer passar sua experiência ao herdeiro do Sr. Yano – o sobrinho, Reinaldo Yano. Se você tiver alguma lâmpada queimada pode entregá-la para conserto na Casa Yano...

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Sputinik


Este foi o artigo mais difícil de escrever. O tema em pauta mistura muita ficção e fatos históricos. Utilizei quase todos os recursos científicos proporcionados pela pesquisa, com o objetivo de separar a ficção da realidade e o resultado foi um fiasco. Ficção e realidade: estavam tão imbricados, que não foi possível separá-las. Diante dessa dificuldade, peço encarecidamente ao leitor que ao ler esse texto, tente separar o trigo do joio. Muito cuidado com as estrelinhas dessa história.

A história que conto foi contada por Benedito Viviani. Na década de 60, em plena Guerra Fria, divide-se Berlim com o muro da vergonha. O astronauta Iuri Gagárin revela ao mundo que a Terra é azul. De um lado o capitalismo, defendido com unhas e dentes pelos Estados Unidos, do outro o comunismo, apoiado pela União Soviética, disputam acirradamente o domínio territorial e espacial do mundo. Uma década depois de Iuri Gagárin ir ao espaço, os americanos chegaram à lua. O que ninguém imaginava nessa época é que, em Cotia, estava sendo elaborado um projeto confidencial para mandar um astronauta a Lua, Marte, e Saturno. Relata o Sr. Viviani, entusiasmado, que no ano de 1962 o foguete estava pronto para ser lançado.

Para que o foguete ficasse realmente pronto foram necessários 10 anos de trabalho árduo. Os mentores da façanha de lançar o foguete em Cotia tinham mais de trinta inventos, inclusive o conserto de lâmpada. Harayuky Yano, Osvaldo Manuel de Oliveira (Osvaldão) e Calil Nicolau, foram os cientistas que lideraram a construção da espaçonave orçada no valor de 5 mil cruzeiros, dinheiro da época. Vale ressaltar que o projeto foi financiado pelo Depósito de Materiais de Construções Bandeirantes. Durante trinta dias o foguete ficou exposto na praça Joaquim Nunes. O foguete atraiu a atenção de moradores da cidade e viajantes que passavam pela Rodovia Raposo Tavares com destino ao sul do país. Todos os visitantes estavam muito ansiosos, segundo um idealizador do projeto. O Sr. Viviani, integrante da equipe Sputinik, relata que a segurança da praça teve de ser redobrada, e os guardas se revezavam nas 24 horas do dia. Dizem que, no período em que o foguete ficou exposto na praça, alguns espiões de origem russa e americana estiveram em Cotia com o objetivo de roubar o projeto Sputinik, que estava muito bem guardado na casa de outro integrante da equipe, o Sr. Aurélio, da farmácia.

1962 foi escolhido como ano de lançamento do foguete Sputinik. Nesse dia, mais de 500 pessoas lotaram a praça Joaquim Nunes. O prefeito Emílio Guerra, preocupado com a multidão que ocupava a praça, providenciou que a guarnição do Corpo de Bombeiros, da Guarda Municipal e mais ou menos 50 homens da Polícia Militar e da Civil ficassem de plantão para garantir o sucesso do lançamento do foguete. Armindo Miguel, conhecido como Lacerda, e escolhido como piloto, era o único da equipe com experiência em aviação, pois tinha trabalhado no aeroporto de São Paulo e pilotado avião de verdade. Após a escolha do astronauta, iniciaram os treinamentos de capacitação.

No dia do lançamento, o Sol brilhava em Cotia. O único erro da equipe foi escolher um estranho para acionar o dispositivo do foguete: o detetive Dimitri Borja Kozarec... Começa a contagem regressiva e, ao final, houve-se um estrondo que forma uma nuvem de 218 metros quadrados. Grande expectativa, logo em seguida muita tristeza: o lançamento fracassou, frustrando a multidão. Segundo Viviani, “o detetive Dimitre era um espião e provavelmente sabotou o projeto”. O detetive foi levado à delegacia da cidade e interrogado com veemência pelo delegado, mas nada revelou; dias depois, desapareceu da cela, misteriosamente.

Após a tentativa frustrada de decolagem do foguete, a multidão ainda permanece na praça lamentando o ocorrido.

O fato não desanimou a equipe que, reunida em um lugar secreto, estava pensando em um outro projeto que ia dar o que falar: o conserto de lâmpadas.

Joãozinho Carpinteiro, construtor do foguete, José Jacaré e Pedrão do Último Gole, eufóricos, apresentam suas idéias para o novo projeto. Acredite se quiser.

domingo, 22 de janeiro de 2017

Cotonifício Demétrio Calfat S/A


Foi a primeira fábrica instalada em Cotia, mas várias pessoas, quando questionadas sobre a industria de fios de tecido Calfat, recordam que a empresa faliu e que muitos trabalhadores não foram indenizados. Apesar deste final lamentável, muitos operários comentam, ainda hoje, que suas vidas melhoraram com a implantação da fábrica no bairro do Atalaia, em 1953.
Antônio Benedito Rodrigues de Oliveira, o conhecido Toninho, que durante 18 anos foi funcionário administrativo da Calfat, recorda, com muita saudade, aquela época e diz que se pudesse voltar no tempo, trabalharia na empresa novamente. Conta o Sr. Toninho que a fábrica e suas dependências localizavam-se onde hoje estão o Posto de Saúde, do Atalaia, e a escola Osny Fleury. A entrada para a fábrica ficava onde atualmente está o posto de gasolina (do Atalaia) e fazia divisa com o campo de futebol. Do lado da fábrica passava a Estrada São Paulo – Paraná, depois rebatizada de Raposo Tavares.
Agustinho Mendes, hoje taxista e conhecido pelo apelido de “Especial”, começou a trabalhar na empresa com 14 anos e lembra que naquela época recebia meio salário mínimo, por ser menor de idade. Assim determinava a lei. Mendes lembra que trocou a lavoura pela fábrica e sua vida melhorou muito. Aos domingos fazia hora extra e os funcionários que apareciam para trabalhar recebiam lanches. Benedita Ramos de Oliveira trabalhou apenas quatro meses na fábrica e diz que logo que começaram as dificuldades financeiras da empresa, ela saiu com medo de não receber. “Dona Benedita do Bar” como é conhecida, trabalhou na seção de fiação e ainda guarda na memória quando pegou fogo na fábrica.
Uma personagem folclórica dessa época é Benedita Antonia da Silva Coelho, conhecida até hoje como dona “Ditinha Benzedeira”. Ditinha não trabalhou diretamente na fábrica, mas servia comida a alguns funcionários. Ela conta que atendia os funcionários das três turmas da fábrica. Os moços que ia comer eram solteiros e vinham de Minas Gerais. Ditinha conta ainda que teve uma premonição de que alguma coisa ia acontecer a um deles. Dias depois um rapaz foi consertar o telhado da fábrica, caiu e morreu.
Joel Francisco, conhecido como “Paulistinha”, também trabalhou na Calfat e lembra que no dia 11 de Outubro de1978 foi decretada a falência do Cotonifício Demétrio Calfat S/A – Codeca. Ele diz que a empresa admitia muitos menores, ele inclusive, que começou a trabalhar em 23 de janeiro de 1958, com um salário de Crz 6,66 (cruzeiros) por hora. Com muito orgulho, ele mostra sua carteira profissional da época, quando tinha 15 anos, e outra, quando já maior de idade. Artur Italiano, que era mestre-geral da empresa, conta que a Família Calfat chegou ao Brasil em 1920 e abriu a sua primeira empresa na rua Brigadeiro Luiz Antônio, em São Paulo. Com o passar do tempo, foram proibidas industrias dentro da cidade e a família precisou transferir suas instalações para outros locais. A industria de fiação foi transferida para Cotia, onde funcionou por 25 anos. Paulistano guarda em sua memória o nome de cada um dos proprietários da Calfat: Alfredo, Inácio, Eduardo, João e Nicolau.
Todas as pessoas são entrevistadas ressaltam a importância da empresa para o progresso da cidade e o carinho dos Calfat para com seus funcionários.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

O Cruzeiro do Carmelo

Sem duvida a Igreja Católica cumpriu seu papel de catequizar, desde o início da colonização. Em Cotia isso não poderia ser diferente.
O trecho abaixo é a transcrição do diário do Carmelo de Cotia, que relata o dia em que o cruzeiro foi levado da Praça da Matriz para lá (28 de setembro de 1969).
“Abriu-se a clausura para o chacareiro. Às 15 horas, mais ou menos, foi chegando a procissão com centenas de pessoas. Muitos homens, a começar pelo Sr. Vice-Prefeito, Dr. Valdemar, e o Rev. Vigário Pe. Enda; carregaram o cruzeiro, que tem treze metros de altura, e nos braços, estão gravadas as palavras: Salva tua alma. Falava no alto-falante o Rev. Pe. Albertine: agradeceu a D. Ana Macieira o ter dado o cruzeiro e agradeceu ao Carmelo por ter cedido para o colocar; falou muito bem da vida contemplativa. Ao colocar o cruzeiro no buraco com auxilio do guindaste, houve fogos, palmas e os sinos repicaram. O povo irá cooperar para fazer um pedestal e torná-lo luminoso. Será a recordação da Missa pregada pelos Pes. Redentoristas. Logo em seguida os Rev. Pes. levaram a imagem de N. Sra. Aparecida no locutório para nos abençoar. Conversaram conosco um pouco e depois se despediram”.

Cinema do Jubran



Linda Riscalla Name emociona-se ao recordar como tudo começou: uma sala de cinema simples e de paredes de taipa de pilão, localizada a rua Senador Feijó, nº 54, inaugurado no dia 1º de janeiro de 1954. Quando ela fala sobre Jubran Name, seu esposo, recorda as dificuldades da época, mas ressalta sua ousadia em abrir um Cinema em Cotia. Até hoje muitos moradores da cidade relacionam o cinema ao nome do Sr. Jubran, mas o verdadeiro nome da sala era Nossa Senhora Aparecida.

Pela conversa que tive com dona Linda, pude perceber o quanto Jubran era apaixonado pela grande tela... quando criança, brincava de fazer cinema no quintal de sua casa. Certa ocasião, Linda encontrou pelas ruas de Cotia o Tadeu Pedroso que, entusiasmado, lembra-se do cinema do Jubran ao assistir ao filme Cinema Paradiso. Sem dúvida alguma, Jubran realizou o seu sonho de ter um cinema e o dos seus telespectadores de viajarem pelo mundo através das películas.

A primeira sala tinha 168 lugares. E ao ouvir dona Linda contar como foi se construindo esse sonho é até engraçado. As paredes, que eram de taipa, com o tempo começaram a ficar esburacadas e iam sendo construídas com tijolos, aos poucos. Quase vinte anos depois, no fundo da antiga sala, se ergueu uma outra sala de cinema, sofisticada para época. Nessa sala de cinema, que faz fundo com a rua Guido Fecchio, funciona hoje a Igreja Renascer.

Uma outra certeza que devemos ter em relação a esse Cinema é que ali nasceram vários namoros. Entre os filmes de grande bilheteria estava Dio come ti amo. As filas para assistir aos filmes iam além da igreja. Outra bilheteria garantida eram os filmes do Mazzaropi. Outro gênero de sucesso eram os faroestes, como Dólar Furado, por exemplo. Além de cinema, o espaço era usado para festivais musicais, e no final do ano para formaturas, principalmente do Grupo Batista Cepelos.

O cinema funcionava de quinta a terça-feira, a partir das 20h30, e aos domingos tinha matinê, a partir das 14 horas. A quarta-feira era dia de descanso. Lembra dona Linda que na quarta-feira, ela e Jubran iam para São Paulo assistir a filmes e que quase sempre assistiam a mais de quatro fitas no dia. Este fato confirma que os dois eram verdadeiros cinéfilos. Nessa fábrica de vender sonhos que foi o Cinema do Sr. Jubran, havia dias do ano que eram especiais, de bilheteria farta, e também aqueles de bilheteria fraca.

O cinema enchia na festa de Véspera de Natal e Ano Novo – “nesse período sempre trazíamos um bom filme”, diz Linda. Quando chegava um circo ou tinha festa na cidade era com certeza sala vazia. Outra semana gloriosa para o cinema Nossa Senhora da Aparecida era a Sexta-Feira Santa. Nesse dia passavam quase 10 sessões da Paixão de Cristo.

Linda Riscalia Name, além de trabalhar na bilheteria do cinema à noite, exercia a função de professora. Durante 27 anos foi professora e coordenadora do Grupo Batista Cepelos e, às vezes, usava uma didática sedutora: o aluno que se comportava bem ganhava um ingresso. Esse critério, às vezes, era quebrado: não somente o bom aluno ganhava o ingresso, como também a classe e até mesmo a escola toda.

Há registros de que anteriormente ao Cinema do Jubran assistia-se a filmes atrás da igreja, no salão de recreação do Morro Grande e na Granja Viana, na frente da casa da Vovó Catarina. Na Granja Viana, em especial, as máquinas usadas para projetar os filmes eram do Jubran, lembra Linda.

O Lendário Nhô Nhô


Teodomiro de Castro Pedroso, conhecido pelo apelido de Nhô Nhô, nasceu em 1894, durante sua existência nesse mundo, fez de tudo um pouco. Foi doceiro, coveiro, compositor, músico, curandeiro, balconista de bar, apontador de jogo de bicho e juiz de paz, profissão que exerceu por 32 anos. A sua filha, Maria Aparecida do Rosário Magalhães, herdou a profissão do pai e fica emocionada quando, ainda hoje, recebe documentos assinados por ele.

Dizem os moradores antigos de Cotia que existia uma brincadeira que faziam com Nhô Nhô e que reforça sua imagem de pessoa lendária. Qualquer objeto que quebrasse poderia ser levado na casa do Nhô Nhô, que ele consertaria. Este fato tornou-se motivo de gozação: quando alguém quebrava algum objeto, ou ficasse doente, sempre tinha alguém que dizia, com o sorriso aberto, manda para o Nhô Nhô que ele dá um jeito. A ele foram atribuídas várias habilidades: além de casamenteiro, Nhô Nhô também consertava dentadura, lâmpada queimada e, de lambuja, aplicava injeção.

Deodomiro também foram atribuídos poderes sobrenaturais. Um certo dia, em frente à Igreja Matriz de Cotia, quebrou um caminhão fordinho, que passou ali o dia todo. No final da tarde, Nhô Nhô vinha subindo a rua Senador Feijó em passos lentos e passou pelo grupo de pessoas que tentava consertar o caminhão, sem muito sucesso. Alguém que estava ali labutando para fazer o fordinho funcionar, gritou para Nhô Nhô, que já estava um pouco distante do caminhão: “Nhô Nhô, o que o senhor acha que tem esse caminhão?”. Meio de lado e ainda caminhado ele respondeu: “Coloque água no carburador”. Passivamente, o suposto mecânico seguiu o conselho: o caminhão funcionou e pôde seguir viagem. Bravo!

Dona Maria recorda que, às vezes, acompanhava seu pai até o auditório da Rádio Difusora para assistir ao programa “Hora da Saudade”, comandado pelo famoso locutor da época Dr. Dárcio Ferreira. Nesse programa, Nhô Nhô conheceu o músico Fego Camargo, pai da apresentadora de televisão Hebe Camargo. Às vezes, Nhô Nhô recebia o amigo em casa para comporem valsinhas e conversarem sobre música; muitas vezes, Fego ia visitá-los para buscar uma bebida de gosto doce com o nome de pau-a-pique. Receita:

Pinga
Açúcar
Canela
Gengibre
Rodas de Limão
Pó de Cravo
Anilina (a cor que você desejar)

Aparecida do Rosário Magalhães encontrou numa caixa de sapato, várias partituras de valsinhas e letras que confirmam a musicalidade de seu pai. Nhô Nhô fez 52 valsinhas. Abaixo um pedaço da partitura da valsa Uma Noite em Cotia. Além das partituras, encontramos uma folha de papel com trechos de duas valsinhas. Nenhuma tem título, mas vale a pena conhecê-las.
(valsinha 1)

Já fui alegre e contente
Hoje eu não sou ninguém
Já consolei muitos tristes
Hoje sou triste também

Que viver triste no mundo
Venha juntar-se comigo
Venha passar como eu passo
Venha viver como eu vivo

Dos meus olhos correm lágrimas
Os passarinhos reclamam
Por não poder se ajuntar
Dois corações que se amam
(valsinha 2)

Parece que é cedo e muito cedo
A minha, em breve findarei
Eu só peço que não vertas uma lágrima
Todo aquela que amizade eu dediquei

Nem tu mesmo oh mulher que eu prometi
De adorar-te como os anjos adoram a Deus
Mesmo assim deixo a todas um abraço
Toda aquela que amizade eu dediquei

PAPAI NOEL REAL OU FANTASIOSO: ESCOLHA QUAL LHE CONVÉM


Papai Noel, traga no seu saco vermelho presentes para todas as crianças do mundo. Para todas mesmo! Não se esqueça daquelas crianças que não acreditam na sua existência. Talvez elas nem saibam que o senhor exista! Mas elas também sonham...  Não se esqueça de atender a nenhuma que esteja neste mundo, mesmo que seja no extremo de algum lugar do planeta. Sejam cristãs ou não, todas merecem a felicidade.

Papai Noel, traga muitos presentes para as crianças refugiadas. Presentes para crianças cujos países estão em guerra. (As nossas crianças estão sendo assassinadas, Noel...) Papai Noel, aqui pra nós, ficar no shopping sentado naquela poltrona fofa é fácil demais. Eu desejo ao senhor tarefas difíceis. Visite quem não precisa da sua atenção, mas neste Natal visite quem mais precisa da sua risada engraçada.Quantas crianças estão sozinhas? Muitas! Elas querem apenas um afago.

Papai Noel, não seja só capitalista. Seja humanista. Não escolha para estacionar seu trenó somente lugares elegantes. Como sugestão, estacione seu trenó em uma comunidade carente, mesmo que lá tenha vários Papais Noéis reais... tem Papai Noel que não é Papai Noel, mas quando chega Dezembro vira Papai Noel. Já vi Papai Noel em algumas comunidades com muitas nuances. Negro, branco, amarelo, azul e aí vai, é só usar a imaginação e viajar no seu trenó. Ah, Noel, queremos só afeto!

Papai Noel, você pode não acreditar, mas têm parentes seus que não usam fantasia. Verdade! É Noel que não esconde a mão a quem precisa de carinho. E presentear também é um gesto de carinho. Carinho materializado. Fico emocionado quando seus parentes visitam crianças internadas em hospitais, e dão brilho aos olhos e um sorriso de esperança a esta meninada. Ver aqueles rostinhos esperando o presente e um abraço do Noel... Quanta esperança é depositada nestes gestos do homem da barba branca! Muitos seres humanos nem barba têm, mas são generosos.

O senhor não vai ficar chateado comigo, se eu disser uma coisinha a seu respeito? Então vou dizer: acho sua roupa vermelha uma vestimenta careta demais, Noel. Ultrapassada. Depois no “inbox” mando algumas sugestões de modelitos. (Risos.) Noel, falamos tanto de crianças que nos esquecemos de quem mais precisa de atenção: os adultos! Abra seu saco de presentes e distribua tolerância, comunhão, respeito às diferenças. Tem muito adulto precisando destes valores. Adulto também gosta de presente e carinho, mesmo que se apresente com pedras em seus sentimentos. É só usar da sua magia, Noel!


Um abraço fraternal e solidário a todos os amigos desta caminhada. 

ROUBARAM O TEMPO...


Roubaram o tempo e ninguém neste lugar do mundo sabe dizer quem foi. Foi muito bem roubado! Roubaram sem deixar sinais aparentes. Foi um roubo planejado. Penso que quem roubou o tempo só pode estar mal intencionado. Mas, como alguém pode querer roubar o tempo? Como alguém pode querer tirar seu tempo? Não tem como esconder o tempo? O tempo e a liberdade andam juntos. Com certeza logo encontrarão esses malfeitores. Até encontrá-los esperaremos o tempo chegar? O medo de todos é que este tempo chegue transformado demais. Desconfigurado! Não dá para esperar o tempo chegar.

Imagine que estes malfeitores resolvam fragmentar o tempo. Imagine que eles queiram transformar o tempo em doze meses. A cada doze meses o tempo vai acabar? (É uma grande besteira achar que tudo muda de um dia para o outro. O tempo não permite). Então, não tem como. O tempo é ilimitado. O pior é querer transformá-lo em dias. Como? O tempo vai além de um dia. Muito mais de um dia! Maldição maior é querer transformá-lo em horas. Em segundos. Em milésimos de segundos. Viveríamos todos condicionados. Temos que evitar essa fragmentação do tempo. O tempo não termina no final de uma data determinada. Vivemos dialeticamente.

O que os ladrões do tempo não sabem é que o tempo tem vida. O tempo pulsa! O tempo chora. Cada um tem o seu tempo. O tempo é coletivo, mas é também individual. Os saqueadores do tempo não sabem disso. Quando descobrirem ficarão decepcionados. Que seu intuito de fazer sabe-selá o que com o tempo, não é possível. O tempo é indivisível.Ninguém pode ser dono do tempo. Porque o tempo daqui é diferente do tempo de lá. São culturas diferentes. São mundos diferentes. São deuses diferentes. Antes que soframos qualquer tipo de catástrofe, peço: Quem souber quem roubou nosso tempo, peça a ele que o devolva, por favor. Não consigo viver sem ele.

Obs: Mudamos durante o tempo. Amadurecemos durante um bom tempo. Mudar de um dia para o outro não é possível, é só na aparência. Agora, mudar na essência, demanda tempo. Muito tempo...